terça-feira, 27 de novembro de 2012

A LESTE DO NORTE - texto sobre a exposição

Em 2004 iniciei o projeto Veredas urbanas que busca traçar um perfil singular do Brasil das grandes cidades, a partir de suas capitais. Ao longo do caminho realizei alguns recortes do material recolhido que resultaram em exposições como  Centelhas da Urbe que fazia  um contraponto entre imagens do Recife e João Pessoa, Estação Lapa abordando um espaço  importante de circulação no centro de Salvador e Trilhas Norte que apresentou imagens das capitais da região Amazônica.
A mostra A leste do Norte está centrada nas capitais nordestinas e assim como as demais exposições, é composta de imagens fragmentárias e  aleatórios dessas cidades.
O espaço urbano se revela nessa exposição a exemplo das outras, a partir de detalhes e jamais de visões panorâmicas. Em quase todas as fotos se repete uma constante que está presente em todo o projeto: a imagem humana é demarcada pela sua ausência. Ela existe tão somente a partir de seu rastro e é isso que a faz existente. Os objetos não valem por si mesmos, nem servem como indicio da dissolução da imagem humana. Ao contrário: essa ausência é como um silêncio à espera da presença que se foi e que promete retorno. É como se na inexistência da imagem humana, pudéssemos nos desvencilhar da banalização que a mídia faz dela ao tentar dissolve-la, para podermos, assim, reencontrá-la novamente, como num momento epifânico. Não importa se algumas vezes os rastros que captamos revelam a degradação do entorno, já que a expectativa do novo manifestar tem poder de dissolver qualquer resíduo dissonante.
A fotografia contemporânea tende a navegar hoje numa falsa polaridade entre a pura descrição impessoal da realidade, como na Escola de Dusseldolf  e  a manipulação da imagem,  seja enquanto interferência de elementos alheios à ela, seja forjando uma imagem teatral, deliberadamente montada.Acrescente-se a isso , a permanência de uma fotografia documental voltada ao cotidiano onde a degradação da imagem do homem é apresentada como uma fatalidade inexorável e o projeto desse,  um fracasso sem redenção.
  Minha fotografia se recusa a ser documento          descritivo ou imagem manipulada. Em sentido inverso, ela busca ser abertura à manifestação do real que se faz para além do fenômeno, como metáfora e a partir da qual o mundo se constitui diálogo entre o fotografo, a realidade e o espectador. Por isso ela também não se confunde com um simples trabalho conceitual, em que os elementos dados visualmente são apenas um jogo cerebral fechado no âmbito do sujeito, como exercício lúdico.
A mostra atual, com imagens das capitais do Nordeste do Brasil, se apresenta a partir de fluxos luminosos contrastantes que oscilam entre a permanência e a passagem, a abertura e o interdito, o estático e o dinâmico, a advertência e o silêncio. Ela se move entre a surpresa do inesperado e a familiaridade do cotidiano. Uma das duas imagem humana que aparecem na exposição de uma festa em João Pessoa, gira na escuridão fazendo contraponto com outra em que a luz que irrompe num cruzamento de linhas na Estação Lapa de Salvador, projeta a segunda imagem humana para fora da encruzilhada. Na placa branca de um posto de gasolina em João Pessoa, quase esmaecida, a palavra Ar anuncia que ali há um posto onde as rodas de um carro poderão seguir, com maior firmeza, seu rumo.
Gabriel Bechara  Filho

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